quarta-feira, 19 de setembro de 2012

A vagabundinha deficiente

Cassio caminhava para a praça. Estava mais atento às mulheres da rua que à música que ouvia. Passava por uma, dava uma olhada na firmeza dos seios e tal. Rosto bonito. Andava mais um pouco, olhava outra. Pernas de gazela, fortes, daquelas que aguentam certo esforço por um bom tempo. Quando passava uma vindo na sua direção, logo se perguntava se deveria olhar a bunda. É normal ficar meio cabreiro por ser identificado como um tarado das ruas. Tocava o foda-se e, assim que ela passava por ele, ele virava o pescoço como se fosse uma coruja. Arregalava os olhos como uma coruja. Bunda boa. Da vontade de seguir até os confins da terra.

Chegou na praça, acomodou-se no banco mais escondido. Coxou seu baseado. Fumou seu baseado. Pirou com a música do discman.

Saiu a caminhar sem destino. Sem destino mesmo, só curtindo a brisa, os barulhos e as mulheres da rua. Esse era o sentido da vida para Cassio. Nada mais era necessário. Só a brisa da maconha, sempre pautada pela correria das ruas, contrastando com o ritmo diferente em que procurava estar.

Chegando ao centro da cidade, as mulheres bonitas surgiam aos borbotões, e ele já começava estabelecer as suas táticas de contemplação de mulheres aleatórias de maneira que não perdesse nem um atribunda, digo, atributo. Para ele, essa fartura era uma dádiva dos deuses. E realmente ele tinha táticas de contemplação de mulheres aleatórias nas ruas. Só que em uma dessas investidas, a tática falhou. Ele achou uma teteia, mas tão teteia, que todas as outras gostosas passaram despercebidas por ele. Ele apenas parou, de longe e ficou a seca-la.

Cassio nunca foi um cara pegador. Geralmente esperava a mulher quase falar, EI, PODE VIR, TAMBÉM ESTOU TE QUERENDO, VAMOS FICAR.

Dessa vez, ele quase não aguentou, queria agarrar ela ali mesmo. Olha essas pernas, dizia para si mesmo. Que bunda! Que cabelo! Que sorriso, que sutileza de pessoa! Ela ali, parada, estática a olhar uma vitrine de bom gosto e ele do outro lado da rua, quase com o pau na mão. Coisa de chapado mesmo. Ou melhor, de homem. Não se contentou com a distância e atravessou a rua. Quanto mais perto chegava, mais linda ela parecia. O seu tesão aumentava a cada passo que dava. Chegou na esquina, parou, contemplou e... não se contentou. Começou com as típicas paranoias de chapado, que estava sendo seguido, que todo mundo olhava pra ele, mas a beleza da mulher olhando a vitrine era muito mais magnética do que qualquer viagem de maconheiro. Respirou fundo, tirou os fones e foi ao lado dela na vitrine. Deu uma de joão sem braço mesmo.

De supetão, ela vira o rosto para ele. Ele quase mija gozando. Retribuiu o olhar, mas na sua cabeça o cagão falava: WTF, VAI SECAR A MINA NA CARA DURA?! Ja não era mais secar. Ela também parecia secar ele. E se secaram por uns bons três segundos. Ele não criou coragem para tentar uma investida. Ia ser patético. Ele ia acabar citando Shakespeare em plena Bonifácio Vilela. Já ela, por mais perfeito que pareça, disse oi, qual o seu nome? Ele pescou o nome e disse: Cassius.

Tudo bem, Cassius?
Aham, e você?
To bem. Vai fazer alguma coisa hoje à noite?
 Não, não, não, claro que não.
Então anota o meu número e me liga, quem sabe queira me ver.
Quero, quero, quero.
Legal, anota aí: Josislaine 998765673.
Beleza, te ligo depois.

Ela se virou e Cassio quase chorou. Quanto mais ela se distanciava, mais atônito ele ficava. Aquele jeito de andar, não era normal. A beleza foi se desfalecendo, mas a vontade de come-la permaneceu, mesmo constatando que ela era deficiente física. Ela andava toda TORTA. Mas ficava parada como uma modelo de moda íntima. Cassio não sabia mais o que fazer. Pô, ela é uma puta gostosa, mas é deficiente. Pego, não pego?

A imagem dela parada a olhar a vitrine não saia da cabeça dele. Não queria acreditar no que aconteceu depois. Ela se entregou para ele e, saiu... manquitolando. Mas qual era o problema? É só uma pessoa um pouco diferente das comuns, é só olhar com outros olhos, pensar um pouco por fora do pensamento comum e mandar ver.

Alô.
Alô. Quem é?
Oi... Jo... Josislaine.
Quem fala?
É o Cassio.
Cassio? Não conheço.
É, te vi na rua hoje, você me deu seu número, lembra?
A é. O gatinho que chegou do meu lado e que parece ter uma pegada forte.
Hehe, não é por nada, mas acho que tenho sim.
Então, ta afim de me ver?
Claro, agora mesmo.
Mas você é afim de SAIR comigo ou ter um encontro mais DIRETO.
O mais direto possível. Quanto mais direto melhor. Gosto das coisas diretas. Gostei de você por ser direta. Quero tudo direto. Quero fazer direto.
Ta, ta, ta, entendi. O que acha de vir aqui em casa?
Com certeza.
Ãhn?
A, vou sim.
Ok.

Cassio foi. Chegou fácil ao lugar indicado. Era um apartamento um tanto suspeito. Era lindo, mas tinha um ar de covil da trepação. Tocou a campainha e demorou um pouco para ela chegar na porta. Ele entendeu bem o porquê. Bem por isso pensou em voltar atrás, mas ela abriu a porta e sua camisola logo o convenceu a seguir em frente. Ela o beijou. Na boca, logo de cara. Um selinho, mas foi na boca. Deu a mão para ele e seguiram em frente. Ele precisou ser complacente. Andou no ritmo dela.

Chegaram no quarto, mal se falaram e ela ja deitou na cama. De barriga para baixo, ela o deixou sem palavras. Que mulher sensacional. Exuberante!

Começou a putaria e... CARALHO, como ela TREPA BEM. Não era de se admirar que ela se remexesse de uma maneira peculiar, o que estimulava o pau dele magnificamente. E transaram, transaram, transaram até   dizer chega. Foi o melhor sexo da vida dele.

Cassio meio que se apaixonou por ela. Queria ela o tempo todo.  Ela trepava com VÁRIOS caras além dele. Muito por um lance de autoestima mesmo. Ter vários caras e ter uma deficiência era para poucas. Manteve contato, treparam por um ano a fio.

Uma vez, ele louco para trepar, ligou para ela. Ela disse que não podia encontrar ele naquela semana pois ia para a faca. Faria uma cirurgia para corrigir seus problemas e teria que ficar de molho. Ele achou ótimo. Tudo iria melhorar. Poderia até sair de mãos dadas com ela na rua e quem sabe pedir ela em namoro.

A semana de espera foi longa. Muita punheta. Ela ligou para ele dizendo que ja estava melhor e poderiam se encontrar.

Ele, como sempre, foi à casa dela. Quando ela abriu a porta, parecia que nada havia mudado. Um tesão de mulher. Já quando ela começou a andar, pular, fazer piruetas e afins, ele ficou abismado. Ela está perfeita! Vamos transar de uma vez!

Levou ela pra cama. Ambos afoitos, quase se comendo no corredor. Deitou ela, e começaram.

Cassio trocava de posição em menos de cinco minutos de sexo. Estava inquieto. Não era mais a mesma coisa. Procurava desesperadamente aquelas transas míticas de sempre. Nada. De nem um jeito. Queria gozar de uma vez e ir embora. Não queria mais saber dela. Uma mulher que perdeu a capacidade de transar.



sábado, 8 de setembro de 2012

Resultado da entrevista que eu fiz comigo mesmo.

"Então, José, conte-nos como está sendo morar sozinho."
"Uma ressaca só"
"Quer dizer que passou a beber bastante?"
"Haha, bastante? A galera aqui é alcoólatra."
"E como consegue conciliar esse estilo de vida com todas as outras coisas?"
"Não concilio, faço uma de cada vez como se não tivesse mais nada pra fazer depois."
"Até no trabalho?"
"Ah, o trabalho é uma merda. Pule essa parte."
"Entra em contato com seus pais?"
"Raramente."
"Sente falta deles?"
"Raramente."
"Na verdade você não mora sozinho, divide um apartamento apertado com um amigo, é isso?"
"Basicamente."
"Você se da bem com ele?"
"Perfeitamente, ainda mais agora que comprei uns protetores pra não sujar o fogão."
"Mas como vocês interagem?"
"Eu falo pouco, ele fala menos ainda. É perfeito. Só comentários pertinentes."
"Os dois são guitarristas?"
"Sim, músicos. Mas eu ando meio relaxado."
"Está gostando de morar sozinho?"
"Está sendo interessante, bem interessante. Temos até um gato."
"Isso soa meio gay. Dois caras e um gato num apartamento pequeno."
"Haha, soa mesmo."
"Como é o nome do gato?"
"Tom Zé."
"E de onde surgiu?"
"O nome ou o gato?"
"Isso me lembrou um vídeo: O GATO OU O QUICO?"
"To ligado qual é, mas você quer saber do GATO OU DO NOME?"
"Do gato."
"Ah, o gato foi minha namorada que deu. Ele já é velho, mas bem malandro."
"Legal. E sua namorada? Agora que você está morando "sozinho" estão transando pra cacete, presumo."
"Pior que nem tanto. Por incrível que pareça rola mais na casa dela, com família e tudo. Mas estamos transando mais sim. Mais e melhor. Nós dois formamos um casal foda."
"Isso é bom. Longevidade."
"Longevidade o cacete. A bebida e o Classic se sobrepõem a qualquer hábito saudável."
"Tudo bem, tudo bem. Pelo jeito a coisa tá frenética."
"Também não é tanto. Ainda não virei um mito."
"Pretende virar?"
"Quem não?"
"Que tipo de mito?"
"Ah, um dos clássicos. Um daqueles que virem referência pra algo foda. Tipo uma nova linguagem, sei la. Já quis ser um mito da música, mas creio que foi fase. Agora eu toco pra curtir. Curto pra caralho tocar, fazer umas jams de ressaca com os camaradas. Banda é algo muito metódico. Ainda mais uma banda desses roquenrou de hoje em dia. O orgasmo musical é a galera terminar de tocar, cair na gargalhada e se perguntar de onde tiraram aquilo."
"Boa. E pretende fazer o que da vida?"
"Ah, passei no vestibular agora, mas isso não muda muita coisa, a não ser o fato de eu parar de trabalhar onde não gosto. Isso é o mais importante."
"Passou em que?"
"Jornalismo."
"Vai ser puta."
"To ligado. Já disse que se eu fosse mulher daria uma bela puta."
"Mas por que Jornalismo?"
"Ah, vai se foder. Já não chega os "ve-te-ra-nos" perguntando isso. Fiz pra me entreter."
" É justo."
"É. Vou pegar um cigarro. Quer um?"
"Quero."
"Acabamos com as perguntas?"
"Você é quem sabe."
"Ta, to com preguiça agora."
"Tem cerveja aqui?"
"Não. Só Presidente."
"Massa."
"Se é..."